
Eu, no mais profundo silêncio, ouço vozes, ouço lindas melodias que não tem origem concreta, sinto vibrações estranhas que me remetem para sussurros que não consigo compreender e não sei se são apelos, chamadas de pranto ou meros olás. Ai Deus, eu estou a enterrar-me na loucura a passos largos, dia após dia, mais uma parede de pensamentos insanos a barrar o meu acesso à sanidade, mais um manto de trapos a cobri-me de atitudes pouco recomendadas e socialmente correctas, o meu mundo está a contrair-se com uma voracidade assustadora, a uma velocidade atrofiadora, o mundo exterior está a desintegrar-se totalmente, a matéria caminha agrupada na minha direcção, não consigo evitar, há uma força em mim que não domino que está a provocar o maior caos em tudo o que me rodeia, que se reduz a pequenas partículas que são posteriormente absorvidas pelo meu corpo e desaparecem para jamais aparecerem, findam-se e escapam deste universo, deixam um hiato de matéria e fico eu e um profundamente amargurado vazio à minha volta… Por favor, Paulo, tens que esquecer tudo isto, partir para aquele mundo que tão bem conheces e nascer de novo para usufruíres das belezas que ele tem para te dar, não te deixes fascinar pelo sentido constritivo da tua loucura, não ames a vida receosa e sem fundamentação que somente perpetua a tua desorganização, a tua entropia e enorme vontade de consumir tudo o que é energia e matéria que te envolve. Não és um buraco negro, nem sequer o podes ser, para que continuar a agir como tal. Eu ouço a corneta da morte a zumbir aqui, nos meus ouvidos, o que chama para o outro lado solta gritos lapidantes que abalam a minha robustez física. Quero sair daqui, quero liberta-me deste cárcere. Oh, não pode ser, ele está a enumerar-me as barbaridades que os seres humanos cometem com prazer, ele faz-me beber da maldade humana e eu sinto-a a instalar-se nos meus aposentos, são coisas que recuso dizer, a minha voz enfraquece, não posso dizer, as paredes dos monumentos eternos da antiguidade estão a ruir e os abutres circundam o meu quarto, mas não há janelas, não estou em África…Não podem ser abutres. Por favor… berrar, quero berrar. As luzes descrevem estranhos deambulares bailantes, valsas energéticas e penetrantes que causam a cobiça dos meus olhos e eu não quero olhar…. Tenho um segredo escondido que não quero abrir… Quem me legou nesta maldição. Não mereço maldições, não, não as mereço por razões nenhumas. Eu nasci para ser anjo, longe da maldade e do pecado. Eu quero trilhar o meu caminho e chegar à divindade, voar sem asas, respirar sem pulmões… A eternidade, o casamento com o universo, eu existe para que os humanos disponham de momentos de felicidade e não quero, nem vou querer quaisquer benefícios próprios. Só quero que toquem o meu bem, que usufruam de bem-estar de paz e de felicidade, mesmo que seja efémera e ilusória, quero vê-los felizes. A mim não, A loucura está a matar-me e a dificultar a minha ascensão aos céus. Deus, porque me legaste este destino….
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