segunda-feira, julho 21, 2008

O conhecimento e o momento

Estamos juntos desde sempre. Lembro-me da primeira vez em que o nosso corpo irradiou os primeiros raios de luz no firmamento do indivisível. Que momento mágico, duas estrelas que explodiram para o brilho ao mesmo tempo, sem precisarem de planeamento ou programação, porque a casualidade encarrega-se sempre de criar coincidências tremendamente intrigantes, factos que não podem ser explicados senão pelo acaso, pelo destino e pelas explicações metafísicas que proliferam e edificam o mundo dos homens.
É impressionante o poder duma conjugação de ápices cósmicos que não podem ser justificados ou perfeitamente compreendidos. É como se houvesse, oculto na escuridão infinita da matéria e antimatéria, um Deus que comandasse o nosso aparecimento, de forma a que ambos os surgimentos se dessem rigorosamente no mesmo nano segundo, num período de tempo infinitamente pequeno e preciso que só pode ser contabilizado pelo complexo relógio da história do universo.
Estranho, se não há Deus, como é que como a história do universo decorre com tanta precisão, e as coisas surgem, crescem e desaparecem de maneiras tão semelhantes? Isto não pode ser assim, não podemos simplesmente afirmar que não há Deus, quando tudo aquilo que conhecemos nos faz o favor de mostrar que estamos redondamente enganados, que as nossas suposições são erradas e que apenas queremos destruir as concepções de um universo que foram edificadas segundo padrões que brotaram do cerne da capacidade para divagar pelo universo no interior da mente humana. Será que essas concepções de homens antigos e sábios seriam assim tão incorrectas? Não estaremos a negligenciar uma das maiores capacidades da humanidade e da vida em geral, isto para não afirmar insolentemente que essa capacidade existe muito para além da vida, nas coisas que não vivem duma anima intrincada?
Nós podemos aceder à biblioteca infinita da história do universo que existe na mais ínfima partícula de tudo. Há uma memória impenetrável oculta pela pequenez do conhecimento humano e que permanece, firme e silenciosa, nas órbitas pequenas e velozes dum electrão, na cisões dos neutrões, lembranças do tempo em que o nosso universo era o universo de acontecimentos perdidos que ficaram eternamente ligadas à matéria que venceu a guerra e que originou o tudo onde estamos, que vemos e não vemos, que cheiramos e tocamos, que vivemos através do sétimo sentido. Porque é que recusamos dar credibilidade a essa habilidade nata, que existe devido aos insondáveis desígnios do cosmos e que dispensa qualquer esforço e empenhamento humanos? Porque é que limitamos o nosso conhecimento àquilo que surge directamente da suposta capacidade racional do ser humano, edificada em observações, experimentações, hipóteses e validações? Porque é que não acreditamos no que nos é bondosamente legado pelo sentimento, pelos sentidos e pelo instinto?
É que é a única forma que me parece viável de combater o marasmo e o aborrecimento da forma de construção do conhecimento humano, que obriga a maioria a parar a meio pela incapacidade de acompanhar a maré. O conhecimento é para todos e a melhor forma de isto se efectivar é pela universalização do conhecimento emocional, instintivo, amarrado a anos e anos de combustão estelar, a viagens inacabáveis pelo vazio, até mesmo pela selecção natural, pela evolução, um conhecimento cujo o começo se perdeu na irrecuperável história do universo, é essa a última etapa da demanda do ser humano pela teoria de tudo, o conhecimento nato que evita as fases do velhinho conhecimento científico e que recupera as incompreensões e as razões superiores do velhinho conhecimento metafísico. Esperemos que o homem não se afunde no inferno que existe no fim da demanda pelo conhecimento científico final e se arrependa de ter relegado o lado mágico, sensorial, espiritual, enigmático, misterioso e todos os outros adjectivos com carga indecifrável que conhecemos para o fundo do baú dos paradigmas da história.
Eu começo a despertar lentamente para esse conhecimento que não precisa de conhecimento, que flúi livremente de cada célula viva que existe comigo, dos átomos que cimentam essas células e dos quarks que sustentam os átomos. Eu não preciso me deslocar deste local onde permaneço à tanto tempo que o tempo se transformou em eternidade, eu sinto-o a abordar-me livremente, deixo-o entrar, choro por ele, riu com ele, existo em seu respeito e aprecio a totalidade da experiência universal sem grande esforço. Serei um privilegiado, um escolhido, ou um mero parvo que não despertou para a realidade pelo medo que esta lhe provoca?
Começo a olhar fracamente para o ócio com olhos de ver, e alcanço a estupidez que é o princípio basilar do capitalismo, a obrigação estúpida de ocupar o tempo de forma útil para o benefício de outros que não eu. Sim, o ócio, a ausência de esforço físico, a contemplação do universo sem movimentos incomodativos ou barulhos inconvenientes, para que ele se abra para nós com todo o seu esplendor, para que vivamos a grandiosidade que é fazer parte de algo maior do que a estranha realidade a que chamamos de nossa. Não a quero para mim. Prefiro receber e aceitar com prazer os ensinamentos dos meus antepassados sábios que professavam a existência de um Deus que guiava tudo segundo desígnios proibidos à maioria da humanidade.
Que quantidade formidável de exemplos que a ganância do ser humano pelo conhecimento supostamente lógico destruiu. São tantos e tão importantes que vou limitar a minha vida a esses sentimentos puros e belos, calorosos e confortantes, que limitam a vida a atitudes, comportamentos e ideias simples, inofensivas, alvas do cerne até ao extrínseco. Fui me neste preciso momento.
Esvaziou-se a bateria física que continua a ser a causadora da minha incapacidade de explodir, de desintegrar-me e fundir-me com tudo. Tristeza, tristeza, ainda sou um homem.

5 comentários:

Henrik disse...

Acho que andamos a ler os mesmos livros de Física. Em termos científicos anda-se inclinado (digo inclinado porque trata-se de quântica e é mais o que se desconhece do que o que se conhece em quântica, a matemática usada e os cérebros que a utilizam por não a compreenderem cada vez mais se inclinam, método científico moderno, a afirmar a aleatoriedade. O Einstein pode ter errado em muita coisa, nomeadamente no que respeita à incompreensão da quântica, mas não errou no meu ver na ideia de que os dados estão lá apenas podemos não saber ler a linguagem. Ainda virá mais uma grande revolução nessecampo, mas já não devemos estar por cá, ou melhor estamos junto aos nossos antepassados dos qual somos uma parte: poeira de estrelas.) para a aleatoriedade. Não discuto a matemática impele-nos. Porém no domínio humano a aleatoriedade dos átomos que decidiram se juntar para nos formar não justifica a consciência, ui, o que fui introduzir agora não é? Pois bem. Podemos sempre apelar à animalidade biológica. E posso sempre ser acusado de filosofias (também é ofensa sabias?) no entanto a consciência momento sináptico importante traz-nos o que já disse anteriormente não só a responsabilidade como, mais importante ainda, a possibilidade de escolhermos mudar os nossos trilhos. Não se é inocente a ponto de se dizer que escolhemos o nosso destino, parvoíce grega, para isso era preciso conhecer o futuro, mas ambos sabemos que o tempo é o elo mais fraco das certezas científicas em termos humanos. Por isso, ainda és homem, também eu, talvez nos tornemos em protozoários na próxima conjunção atómica. Não importa muito agora, és átomo de átomos faz de ti aquilo que és, se não quiseres reage à conformidade e inconforma-te. A certeza racional é Humiana sucedâneo de factos que cremos com firma certeza ser assim que se procede.


P.S. Fui aluno de um eminente professor de física de seu nome Rui Moreira, obtive inúmeras conversas com ele e com outros da sua área.
Recentemente, em conjunto com o prof. Croca alguém que estimo pela sua perspicácia e inteligência, publicaram um livro que anda a causar sensação nos meandros científicos não lusitanos claro está é o seguinte: Diálogos sobre física quântica [dos paradoxos à não-linearidade de autoria de José R. Croca e Rui N. Moreira, editado pela Esfera do Caos. Creio que irás gostar. É introdutório a um problema actualíssimo e é feito em registo de diálogo platónico.
Abraço!:)

Saulus from Inner Space disse...

Merci Friend, normalmente leio as obras de físicos estrangeiros em língua estrangeira, mas sinto um profundo pesar pela pobreza de autores portugueses que se dediquem a esta questão. Por acaso conheço essa obra que foi recomendada neste site http://astropt.org/blog/, entre outras. É um site belíssimo que prima pela simplicidade, mas sempre com um enorme profissionalismo, cuja mais valia é orientar a nossa vontade de conhecer para um universo de informação mais amplo.
Ps - Agora tenho que terminar o mestrado, por questões de orgulho pessoal, porque senão tentaria o ensino superior para maiores de 23 em física.... Quiça um dia. Morro por este tema. Abraço

sombra e luz disse...

Agora que os meus queridos amigos revelaram mais um dos tantos!... e curiosos laços que nos unem...;) quero perguntar-vos...
Sabeis da experiencia que eles andam preparar, numa desenfreada corrida entre o velho e o novo continente?... para caçar o busão de higgs?... sabem que aquilo vai provocar um ou vários micro buracos-negros... sabem como é que os buracos negros crescem?...;)
Pois... 2012!...;)

Fico super-feliz que essa música do inferno que ouvis...;) não vos tenha endurecido o ouvido ao ponto de não saberdes escutar a longa, lenta e maviosa melodia das esferas... ou o burburinho indiferenciado da estática...;) dais-me esperança... abraço...;)

Saulus from Inner Space disse...

Querida Sombra, já sabiamos que existia este gosto em comum, mas desconhecia que a Sombra também o partilhava. Sim, conheço a caça ao Boson de Higgs e esperemos que a sua caça seja frutífera, ou seja, que ele exista. Conheço o processo de formação de um buraco negro e também sei o que ele despoleta, mas atiro as minhas previsões do 2012 para os Judaliens e Cardeal Ratzinger.
Sabe, pessoas como nós, que não encontram satisfação nas várias religiões que existem na Terra, procuram colmatar as suas insuficiências espirituais, que são intrinsecas à nossa humanidade, com as explicações científicas da existência, em especial da Física, porque esta vem provando que nada acontece por acaso e isso transmite-lhe uma forte carga de espiritualidade que ninguém pode explicar.
O amigo Albert foi certamente o primeiro a alcançar este novo patamar da religiosidade. Os restantes seres humanos só agora começam a olhar para o cosmos de modo diferente. Temos que ir beber uns copos e divagar no cosmos juntos LOL

Henrik disse...

Eu ando mais inclinado para um curioso cambiante a ciência não prova o método é mais demonstrativo. O acaso é, a meu ver, mais uma circunstância de se desconhecer os elementos de um teorema qualquer. Tanto na física como no plano da consciência humana (onde a física como não podia deixar de ser é preponderante) o desconhecimento dos factos, e a impossibilidade de garantir se alguma vez os poderemos conhecer totalmente: eis o que chamamos de acaso.
Na realidade a experiência de caça ao Boson de Higgs já foi feita inúmeras vezes, o problema é que de todas as vezes em que se realizou apareceu sempre um (ou vários) elementos totalmente aleatórios e inesperados e é nisso que se andam a concentrar. Por exemplo, cada vez , a um nível quântico, se começa a perceber melhor que a a velocidade da luz não é a velocidade mais rápida que existe por esse cosmos. Outra coisa que me parece relevante é o que o físico português afirmou sobre a inconstância da velocidade da luz, que me parece ser mais próximo dos dados que se vão obtendo actualmente.
Sombra: o inferno é o lugar próprio do ser humano.
E sei como é que buracos negros crescem na mente de muita boa gente, LOL.