segunda-feira, março 16, 2009


Luzes, milhões de pequenas luzes impedem-me de desfrutar da escuridão perfeita. Odeio as luzes. Malditas luzes que oscilam ao sabor dos movimentos irritantes da minha cabeça, que, na falta de consistência mental, vacila alarvemente de um lado para o outro, da esquerda para a direita, de cima para baixo. E tento auxiliá-la apoiando sobre a firmeza obsoleta duma cadeira ultrapassada. Olho para o infinito do meu interior, tão apinhado de sombras e escuridão que mal consigo discernir onde se escondem as minhas memórias e onde vive o meu medo, e as luzes exteriores que maldigo irrompem-me a minha retina sem que eu lhes houvesse dado permissão, e a amofinação de querer ver-me a mim a sofrer de um sofrimento azedo é dulcificado por luzes difusas e humedecidas que brilham para lá da janela que me expulsa do meu mundo. Que razão tenho para ter um momento de imaginação, que razão tenho para escutar os sons nebulosos que ecoam em meu redor, que razão tenho para acreditar que a minha vida é um sonho que se desenvolve no limiar do sono da morte. As noites aquecem de sofrimento, de angústia, de loucura, no âmago da minha solidão brilha um luz ténue e exânime, uma luz que talvez tivesse existido num tempo passado onde eu e eu éramos um só, com um objectivo comum, com esperança, com razões para acordar de manhã e levantar as mãos para o céu em jeito de agradecimento pelo grandioso sol que brilha ao renascer dum novo dia. Infelizmente, agora só sombras me contemplam pela manhã, sombras que destruíram o meu sono e que querem igualmente destruir o novo dia que acaba de nascer. O dia é um nado morto e eu acompanho-o na sua trágica demanda. Não há sol, não há um novo dia, não há luz. A luz é maldita e não deixa que sossegue, que aprecie cada segundo cáustico do meu isolamento.

sexta-feira, março 13, 2009


Vivo por viver. Vivo torturado dum tormento que não consigo descrever. O mundo não tem cor e as cores não têm brilho. Vivo por viver e para morrer. Por muitas voltas que dê à vida, o único ponto de referência que tenho é o desusado lugar onde permanece a minha atenção, um lugar cheio de ruídos de fundos e gritos de desespero, que, no entanto, não têm origem concreta ou simplesmente fogem ao meu discernimento. É banal viver aqui, é banal respirar este ar sem frescura, é tudo uma vasta choça enferma e desconceituada. O tempo passa rapidamente, mas para mim os segundos são eternidades que não podem ou não devem ser compreendidas, o mundo gira e pára e eu continuo às voltas nas mesmas questões de há não sei quanto tempo, numa busca incessante de respostas às quais jamais foram feitas perguntas, a rotina que se continua e se perpetua num enjoo e sofrimento que é por tudo indizível. As televisões calam-se e os rádios fazem votos de silêncio. As pessoas querem dizer-me palavras de conforto e esbatem na minha inépcia para dialogar, e interrogam-se da virtude do meu ser, que no seu âmago é frio e azedo, repleto de ervas daninhas moribundas e tempestades de ventos estivais. Que paisagem desalmadamente branca e cinza a que vejo na ruas repletas de deambulantes. Neves eternas encrostam-se aos corpos agitados da voz da infelicidade em sintonia absoluta com as neves que revestem as árvores da minha alma boreal. Quero lamentar-me, quero xingar-me, quero dizer de mim aquilo que penso e sinto, o que vejo e o que imagino, e tudo é um novelo de lã sem início nem fim. Talvez sangue, sim, é sangue que escorre dos caracteres do livro da minha vida, um sangue que não se parece com o sangue que aquece os corpos. Chamei-lhe sangue sentimental por senti-lo emanar das fendas sub-reptícias e camufladas da minha insanidade. Se eu soubesse que isto é desesperar, perder o horizonte e o olhar... Que sacrifício.

quinta-feira, março 12, 2009


Prescindi de me servir de ti para salivar os nós cegos que se atam avidamente ao caminho das palavras. Sinto a tua falta e mesmo assim sou incapaz de te apelar quando mais nada nem ninguém está disponível para me ouvir. E dúvidas começam a suplantar as certezas, as forças nas pernas começam a fraquejar e o sistema nervoso contraria-se a si próprio. Tenho amontoados de linhas que mantive em cativeiro sem que disso tivesse beneficiado, quando o que queria era desmontá-las em pequenas palavras e envia-las a ti, que lês, relês e critica-las, e não te deixas subjugar à ganância e ao egoísmo do meu pensamento. Poderia descrever-te com todos os pormenores, úteis e inúteis, a sensação de esmagamento que tenho na cabeça, a dor que advém de não ter a mestria de verbalizar os sentimentos, as mãos tremulas que transmitem a insegurança e a vontade insana de apagar da memória estas malditas reacções que me diminuem perante os demais. O curioso é que eu nunca pedi os demais, mas eles permanecem junto a mim como que a lembrar-me do castigo que me inflijo por querer infligi-lo por mim. O meu cérebro perde tino a cada quilómetro temporal percorrido e eu assisto impávido à minha destruição, querendo umas vezes desaparecer intensamente ou ficando parado na minha doce apatia nas outras tantas que não consigo enumerar. É um inferno viver em nós mesmos, esquecer que somos um grande ente que vive em função da funções do todo, apagar as luzes para dissipar o pensamento, como se isso fosse viável, e rendermo-nos ao esquecimento dos químicos. A minha paciência, que até hoje tem sido quase divina, começa a manifestar a sua fraca humanidade. Fartei-me de estar farto de mim, fartei-me de mim e fartei-me de me fartar. Quero mais…. Quero mais monotonia.

sexta-feira, janeiro 23, 2009


Ando despojado de empenho de viver, a fraqueza é dona e senhora do meu corpo. Ando a leste do paraíso, a meio caminho da apatia, o sol põe-se a poente e não volta a nascer, ando sumido no medo incompreensível de cair numa rotina maldita e sofro por sofrer de mim mesmo, sem viabilizar as razões do meu medo ou o medo de ser de mim. A chuva continua a cair e o meu querer de deambular pelo mundo dos outros resume-se a uma necessidade de estar constantemente deitado, de mente e sentimentos vazios, voltado para o lado oco da minha própria existência, onde nem eu nem as imagens erradas da minha imaginação chegam a um acordo. Vivo assim, envolto na nostalgia das coisas que não vivi, carente dos sentimentos que nunca senti, à espera que a vida me oferte aquilo que nunca pedi. É mau demais, mas, de qualquer maneira, só consigo reconhecer o pior, como se ele e eu fossemos um só, destinados a caminhar de mãos dadas por caminhos em que o negro reveste as três dimensões que o meu físico pode sentir e às vezes tocar, já nem sei, nem sei sequer se são somente três as dimensões que o meu todo alcança. Isso é irrelevante. É tudo negro na mesma. Sou um cadáver vivo jogado a uma desinteressante sequência dos mesmos acontecimentos por si só desinteressantes, acamado no leito das agonias que não se manifestam de maneira a conseguir uma alforria e regressarem ao solo, ao profundo, ao centro da terra, ao local calmo e silencioso que serve de baú às agonias que surgem sem explicação. Dá-me um latejar no peito e na garganta, altera-se-me o ritmo cardíaco enquanto o coração conduz a orquestra duma morte prematura, talvez demasiado tardia tendo em conta o que o destino me reservou, mas continuo a fintar a morte sem saber muito bem o porquê ou o como, estranhando o momento em que adquiri esta arte curiosa, e a vida continua impávida e serena e eu embebido na minha agonia, fraqueza e nenhuma intenção de viver. Salvem-se, pelo menos, as melancolias e as nuvens, o cinzento, a densa neblina, as paredes húmidas do prédios e das estradas, o som continuo de água a correr, os limpa pára brisas dos carros e a insuportável corneta da morte, porque eu da vida já não espero mais nada… Resta-me a rotina, a dolorosa rotina de uma vida com paragem no suicídio, no suicídio dos sentimentos e das confusões, dos porquês e da vitimização, à espera que o meu corpo caia pesadamente no leito que me acomodará para o eternamente. Vivo para morrer, é isso.

sexta-feira, janeiro 09, 2009

Por razões de força maior, o trabalho deste cronista do reino continua neste sítio Sem Sura . Não temam, ele tem a capacidade mágica de se desdobrar e rapidamente presentear-vos-á com novas e fascinantes viagem ao mundo obscuro do seu ID.

quarta-feira, dezembro 31, 2008


Não sei se tenho frio ou calor. Nem sei sequer se existo para além das oscilações de temperatura que se fazem sentir aqui, no gelo, mas, no entanto, estou tomado duma certeza com a qual aprendi e continuo na aprendizagem de viver. O frio é a temperatura definitiva da minha alma. Teço fogueiras imaginárias dentro da minha imaginação, as quais são abundantemente regadas de combustíveis impossíveis, realizo diligências por lugares solarengos na imensidão do equador da minha vontade e o resultado é sempre o mesmo, frio, um resultado que não trás nada de novo à situação que condiciona a demanda e afundo-me, afunda-me. Era bom saber que havia escondida no mundo do reais a solução para a rigidez mórbida que deturpa a alma, que apesar de acompanhada por uma imaginação efervescente e activa não desvenda as forças fundamentais para que a fricção de sentimentos despolete numa chama, num simples e quente fogo que alteraria a temperatura que há em mim e dentro de mim. Toda a gente grita que no mundo a única coisa que permanece para além do ódio e dos sentimentos pestilentos da alma são a fraternidade e o conforto que sentimos quando vivemos os dias das nossas vidas com os nossos iguais, e isso é a verdade que me fere por ser a maior mentira que consigo e quero conceber. A distância dos meus pares, um pouco à semelhança do lobo que, por fraqueza, perdeu o lugar na alcateia e vagueia, só e dolente, numa demanda pela sobrevivência, é a caldeira do calor gelado que orienta a globalidade do meu ser, do despertar desalinhado, ao deitar aterrorizado. Que vida fui escolher, ou talvez tenha sido escolhida por mim para mim, que nem sequer consigo conceptualizar as temperaturas da forma que os outros as concebem, e aproveitam, e jubilam por ser tudo um inverso do meu desgosto setentrional. Sou eu é de mim a tundra das almas, sou eu e é de mim a taiga dos desolados. A minha débil alma emigrou para as bandas do norte e o meu corpo permanece no seu (in)feliz recanto onde são glorificados aqueles cuja a alma emana uma luz e um calor interior assinaláveis e lega à desgraça os filhos malditos que essa luz e esse calor negligentemente conceberam.

segunda-feira, dezembro 15, 2008

Aqui estou, novamente a cavar a sepultura onde de futuro serei a recordação infeliz de um corpo que em outras alturas teve uma alma. Continuo a cavar com a mesma intensidade e impetuosidade que cavei quando o buraco era apenas uma passagem tenebrosa e infinita para uma realidade à qual jamais me acostumaria.
Lembro o dia em que o buraco desmoronou como lembrarei o dia em que o buraco que cavei voltou a fechar-se, e nesta sucessão de lembranças acordo para a verdade daquilo a que, com contemplações e falas meigas, me sujeitei sem clamor nem alteração. O ritmo de trabalho assemelha-se a um caminhar desajeitado de um aleijado, que por não saber andar, preferiu atirar-se a um rio e pelas águas sujas e malignas ser conduzido, sem contudo obliterar o caminho que, com dificuldade, foi traçando com o arrastar lento e pesado do seu corpo morto, que é morto desde o dia em que em lágrimas despertou para a vida. Nesse caminho há tempestades assustadoras e raios que se revoltam em variadíssimas direcções, e no fundo de um vale encoberto pela luminosidade de uma estrela que não é feita da mesma matéria de que são feitas as estrelas a que vulgarmente costumamos associar a luz que por elas é emitida, que no fundo pouco ou nada representam quando comparadas com a cerração a que o sol sujeita aqueles que da noite fazem dia e do dia um sarcófago para uma mentira, abre-se a possibilidade de deixar de cavar para cair num buraco feito por outros iguais aos outros, mas senhores de uma outra cobardia, a cobardia de descobrir se do lado de lá há alegria.
Tempos mortos estes em que a chuva cai em direcções incertas sobre uns ombros que carregaram fardos invisíveis, mas estranhamente penosos, tão enfadonhos quanto a monotonia pode ser enfadonha e o fado que uma estrela que deveria resplandecer pode doar-nos a nós, amantes duma obscuridade que não concebe outra situação que não a luz, mesmo quando das paredes escuras dum céu carimbado de estrelas se forma uma luz que não serve para iluminar. É isso que me entristece e me incentiva a continuar no cavar para uma posteridade na qual o reconhecimento será dado aos montes de areia que se formam aqui e ali e que em nada contribuem ou contribuirão para o reacender da chama das estrelas caprichosas e bandidas que acenam alarvemente, sem contudo atribuir aquilo que, por palavras mais sinceras, poderia representar um rasgo de felicidade. E a tristeza afunda-se em nós e o barco que é a nossa alma, que vigorosa - como o barco a que correspondia - navegava sobre as vagas de um sentimento soturno e desconhecido, perde o barqueiro lúcido que sabia que destino poderia hipoteticamente agradar à sua tripulação, tristes bandidos duma noite sem luz que, na amargura de uma amanhã que será exactamente igual ao amanhã que foi ontem, continuam na árdua tarefa de cavar o buraco que se abriu no dia em que, com lágrimas e pranto, despertaram para a vida. Deste lugar tolhido pelos antepassados dos homens que acreditavam na beleza de um futuro em que as estrelas não só iluminariam os caminhos do dia, mas também iluminariam os caminhos da noite, não quero recordação que sobreviva ao dia em que o corpo regressar ao buraco fechado que assim está na certeza de que esse corpo ao buraco volta porque da sua alma foi rendido. Infernizados sejam todos os que me venderam sonhos com defeito e futuros com alegrias em catadupa. As catadupas defeituosas de sonhos destruídos são a única recordação que ficou desse caminho amargurado que com o corpo pesado de uma aleijado percorri. Vou apagar as luzes falsas que me alumiam, para de seguida jogar-me ao buraco encerrado que jamais voltará a ser aberto a não ser por magia, uma magia que não conhece outra qualquer e que reside dispersa em bocados de papel apodrecido, e dos sonhos desfeitos, das estrelas manhosas, das verdades absolutas, das tempestades de raios, dos despertares em lágrimas para o pesadelo que foi uma vida libertar-me-ei para sempre.

quarta-feira, dezembro 10, 2008

Que confusão, que tremenda confusão a que tenho aqui dentro de mim. Não sei se deva escrever aquilo que sinto ou sentir aquilo que escrevo, talvez deva embrenhar-me nas palavras que flúem dos meus pensamentos e flutuar na sua liquidificação como o navegador que navega nas vagas furiosas que levam ao sossego de um lugar imaginado por utópicos. O meu interior está repleto de erupções vulcânicas que expelem lava sem parar e a minha fúria alimenta-se dessa lava que a faz aquecer, arder, iluminar a confusão das minhas ideias, o caos que se instalou paulatinamente na minha razão. É tudo escuro, nem partícula de luz consegue alcançar-me, estou prostrado perante a minha miséria e fervo de ódio por ter na morte uma amiga que pouco ou nada diz e que me mira com aqueles olhos de clemência e de vingança, e a raiva cresce, cresce, rasga carne, rasga a pele, corrói os órgão internos e envenena a corrente sanguínea de tal modo que uma dor lancinante invade o meu corpo sem que este delibere a menor resistência. E os zumbidos enervantes continuam a atormentar e a atordoar os meus ouvidos e mal consigo raciocinar, mas como poderei raciociar se estou a submergir na insânia, na demência, na alienação absoluta? As paredes estão repletas de silhuetas difusas e as silhuetas gritam como gritavam os monstros que me perseguiam nos meus pesadelos e o medo, o mesmo medo que tinha quando dormia, sobe da base dos meus pés até à ponta dos meus cabelos, estou envolto numa película invisível de medo, e contrai-me, impede-me os movimentos, prende-me, prende-me e quero sair, o medo está a ferir-me e os meus dedos estão a congelar…. Frio, frio, gelo…. Os pés enraizaram ao chão e a loucura sobe e desce dentro de mim e ironiza com a minha consciência, forçando-me a querer gritar, mas o medo gelou-me as cordas vocais. Que posso fazer, Deus, que me deixaste aqui jogado a este canto, a padecer no medo. Chama-me a morte, por favor. Pede-lhe que seja empática e que me leve daqui para fora, que traga as asas que roubou aos anjos malditos que foram expulsos do inferno para que com elas ouse tentar sair daqui, do inferno vivo em que vivo. A beleza, a beleza da humanidade está ali, está ali o amor, a compreensão, o aconchego de um abraço amigo reconfortante, do lado de lá das paredes que me ladeiam, e a molesta porta de saída aparece e desaparece e nunca está no mesmo sítio, e o ódio em mim já não pode ser controlado, está totalmente fora do controlo, estou com medo de mim. O ódio dilacera-me de dentro para fora, estou às portas da loucura, ai raiva, frustração, medo, medo, quero chorar, dizem que o choro ajuda a afogar a tristeza e a tristeza é a maestro da demência e tudo isto não passa duma sinfonia há psicopatia…. Parem… Parem, não quero ouvir mais, não quero ser um pião nas vossas brincadeiras infantis e cruéis. Libertai-me, quero equilibrar-me, quero respirar fundo e sentir o ritmo cardíaco a abrandar. O meu coração vai explodir, o meu cérebro vai explodir…. AHHHHHH…… morte, porque não me ouves?

terça-feira, dezembro 09, 2008

É tudo confuso quando a nossa mente não combina com a realidade que nos rodeia. O cinzento eleva-se à condição de cor dominante, as pessoas não possuem rosto, os movimentos apresentam-se estanques, a água não faz os ruídos encantadores a que estamos habituados, o céu não tem noite nem dia, as estrelas não brilham, o sol não é encoberto pelas nuvens e nunca chove. A tristeza é o sentimento reinante e constante no mundo em que as coisas são como os outros querem que elas sejam e onde nós próprios somos um reflexo opaco daquilo que poderíamos ter sido se, porventura, houvesse em nós outra certeza que não fosse o medo. E continuamos neste marasmo, de olhos concentrados nos desenhos geométricos dos passeios, perdidos no desequilíbrio ténue da relva dos jardins, submersos pelos altos e baixos do asfalto que segura os carros, e dá-mos por nós incapazes de levantar a cabeça e apreciar o fresco que ilumina o céu de todos nós e que tão carinhosamente foi elaborado pelos artistas incógnitos que imaginaram o universo. Queremos aprecia-lo e ter a coragem que falta no momento em que bastava elevar um pouco a cabeça para contemplar o que nunca vimos, mas, quando voltamos a ter consciência da nossa própria existência, constatamos que apenas continua a existir o cinzento que sempre existiu e que nunca mudou, e continua a ser aquela cor soturna que preenche os objectos da minha fantasia e não existe nada para além de mim a não ser a morte e um profundo lamento por em algum momento do tempo ter existido. …. Morri dentro de mim outra vez.

segunda-feira, dezembro 01, 2008

1893

Queria escrever alguma coisa, pequena que fosse, acrescentar um bocado de mim à imensidão obscura que me envolve, libertar-me destas amarras que me chagam os pulsos, que fazem com que recue quando quero avançar, mas não tenho força, sou fraco, meloso, débil, fraquejo sempre nos momentos em que o destino me favorece com meia dúzia de portas abertas. Continuo a ser um bruto mal agradecido, um egoísta, um ser pérfido que gruda indirectamente a realidade à sua teia para depois, aí directamente, a destruir… Não o faço por mal… é a danação que me calhou.
Continuo a pensar em mim e em mais nada, continuo preso ao fascínio que tenho por mim mesmo, que me faz adorar os dilemas e problemas em que vivo e que não existem, e oculto-me sob o véu farto dum belo olhar que pouco mais percorre do que a distância entre a ida dos meus pensamentos até à retina e o caminho de volta às minhas idiotices. O meu cérebro é feito de poeira, que levanta à mínima agitação, ao mínimo movimento, transformando-se subitamente numa confusão que se centra sobre as confusões que o compõe a si mesmo. Não há Inverno nem Primavera que quebrem ou façam renascer ao folhas que se alimentam eternamente de ideias nos galhos da minha obsessão por mim mesmo, e os anjos das religiões pequenas continuam a ser os alvos preferenciais da culpabilização por o universo continuar circular em meu redor, pelas coisas pequenas e grandes manterem as suas órbitas no limiar daquilo que pode ser por mim processado através das experimentações pelos sentidos, quando nada disso acontece, é como se o meu peso e pesar obrigassem os espaços e os tempos a condescender e as realidades, os pensamentos, os sentimentos, as agitações, os receios, as peripécias e a vida das pessoas ficassem conglutinadas em mim, mesmo sabendo que incomodam profundamente, os seus sons, os seus movimentos, a sua afectuosidade, a sua paixão, o mundo em que vivem, e eu próprio, raios. O mundo, este onde eu e todos os outros existimos, uns com prazer, outros com ódio, dilacera-me de dentro para fora, debaixo para cima, faz-me querer parar de respirar a qualquer momento, rasgar a carne e sangrar até não poder mais e fenecer. Mas a cobardia, a maldita cobardia que proíbe que eu dê o passo seguinte, o medo de perder as pessoas, os sons, as agitações, os cheios, os sentimentos e a vida que tenho é maior do que a falta de vontade de permanecer neste lugar infernal que existe para que as pessoas penem por crimes que realizaram numa realidade e num tempo que só a Deus compete delimitar, um designío divino cheio de incongruência e falácias. Este lugar dos infelizes é cruel, doloroso, sombrio, mas é tão belo… o mundo que se construiu à minha volta e no qual eu, qual criança que brinca com os legos, fui colocando as minhas peças, este meu mundo é lindo e eu adoro-o, não o quer perder e amaldiçoo a morte por saber que um dia ela mo levará, mo roubará, mo tirará sem dor nem clemência, com prazer e satisfação, e vou ficar aqui assim, estendido, pasmado, a sofrer pelas pessoas, pelos sons e pelos sentimentos que o destino fez o favor de me roubar. Não, não mereço isso. O mundo tem que permanecer da maneira que é e que sempre foi, as pessoas que amo devem ficar para sempre ao meu lado, os sons que me agradam devem tocar suavemente nos momentos que eu assim o quiser, os pássaros devem vir cantar-me aos ouvidos assim que o sol se levantar, a ternura deve despoletar quando o caos agita e a morte não tem o direito de destrui-lo, o meu pequeno mundo que tão loucamente adoro.
Inevitavelmente, não tenho os poderes que os homens atribuíram, no seu receio pelo desconhecido, aos Deuses e por isso o mundo do meu ideal vai ruir e o meu egoísmo será ainda maior e casará com o desprezo, com o desencanto, e aí a maldita cobardia acabará por ceder e eu vou poder reconstrui-lo, tal qual como era, no mundo que será destinado aos homens que, por cobardia, não de morrer, mas de querer continuar a viver, estiver destinado… E aí partirei para a luz distante… partirei para a luz distante…

segunda-feira, novembro 24, 2008

Estou acima de toda a gente, acima de qualquer elemento da humanidade, estou a meio caminho entre a sublimidade divina e a declinação humana. Estou num estádio confuso que não é do conhecimento de ninguém a não ser dos Deuses e dos Anjos, um caminho que não leva a lado algum, um caminho que não tem principio nem fim, rectas paralelas ou transversais, subidas ou descidas, um caminho que não tem destino e nele falta a razão para que homens o possam trilhar visando um objectivo, que não há, o único objectivo que existe neste caminho que é feito de outros caminhos fechados em qualquer direcção é o de ficar aqui para a eternidade, retido entre muros de mitos e paredes de receios. É neste caminho que se cimentam as mentiras que a humanidade educou para que ela própria continue fechada no seu pequeno casulo mental que a inibe de despoletar para o horizonte das coisas que são como efectivamente são, sem mentiras e medos, sem suposições ou conjecturas, no caminho que só os homens que desobrigam o seu espírito conseguem chegar e lá permanecer, e o receio passa subitamente a ser considerado uma barbárie, uma ideia que atemoriza os ignorantes, que por medo preferem ficar encadeados àquela banal bola azul, que é pouco mais do que a penitenciária dos homens fracos e crentes, crentes nos progressos que fazem, nas pequenezas que descobrem, nas pessoas que amam, no dinheiro que querem ganhar, na avareza… eu plano aqui, só e silencioso, mudo no meu autismo e pronto a ultrapassa-lo para voar para aquele lugar que foi destinado aos homens que deixam de ser homens pela sua pesquisa dentro de si mesmos, do consciente, da incógnita que é a mente, e são projectados para lá destes dois níveis abaixo do verdadeiro nível que quero(emos) alcançar, longe do pequeno e próximo do Grande, Próximo do Pai, ao lado de Deus… Desse maldito caminho tolhe nos as esperanças, dilacera nos os ideais, corrói as nossas convicções e tornamo-nos em meros homens que, com intuição de homem, optam por voltar para trás. Eu não volto para trás. Eu vou seguir, subir, descer, bater, magoar-me, seguindo no sentido em que as forças me quiserem levar, e vou com prazer, de alma e corpo vazios, na esperança de alcançar o fim para esta tão longa e sinuosa empresa. A minha esperança é resistente e não cai à mais pequena contrariedade e reforça-se, nos mitos, nas mentiras, nas quebras de vontade, na destruição das esperanças dos outros e sirvo-me delas como pedras em queda que me dão propulsão para os outros estágios complicados da minha ascensão à divindade. Quem me dera poder evitar a maçada que é caminhar em caminhos que não têm suportes físicos, que não tem as comuns noções de espaço que nos auxiliam na vida no mundo exterior, mas a minha demanda é constritiva e introspectiva e o objectivo divino a que aspiro vive pacificamente no interior das minhas células, no interior dos meus átomos, em cada bloco que torna possível que estejamos aqui. É esse estágio que procuro com tanto ardor e é nele que me quero embrenhar, com ele casar, tornar-me eu com ele num só, fundir-me em novas partículas e alterar as concepções do universo que carece de ser descoberto… Quero torná-lo em algo cuja compreensão ultrapasse a própria compreensão do universo, quero ser a partícula de Deus, aquela que todos procuram e que não existe. Vou existir por ela e eles serão forçados a reconhecer que é na mente humana que existe a partícula que explica a génese do universo desde o nada até ao tudo, o processo de planificação, a concepção, está tudo delicadamente arquivado por Deus para que os homens sejam capazes de ver onde se esconde a verdade daquilo que ele criou, o enigma, o quebra-cabeças, o porquê de estarmos aqui e o porquê de ter que haver alguém que nos tenha colocado aqui. Procurem, eu já encontrei, quando fecho os olhos e liberto os dedos num teclado de computador, e na minha mente há soluções que se misturam com as minhas células cerebrais e o caminho abre-se como o livros que abre na página que o leitor quer ler ou marcou porque, naquele momento, ainda lia por ali. Eu quero devastar a terra e o espaço, eu quero ser a consciência que domina o destino dos cosmos, dos homens, e dos outros que andam por ai, dispersos por esse universo que nasceu das combinações incompreensíveis que se deram com as partículas que são minhas e que foram doutros e que foram de coisas que não sabemos o que foram e nasceram no principio e viram o que todos procuramos ver e que eu já vi. Eu talvez não, mas viram as minhas partículas, a minha composição em primeira-mão e disponibiliza-me esse conhecimento arquivado amavelmente na minha memória sub atómica. As confusões possuem-me, já começo a perder a fluência, já não sou loquaz… Não posso continuar, não me é permitido…. Começo a sentir a constrição nestes meus momentos de abertura, de informação, sinto que avanço e alguém me puxa para trás e eu sei quem é, a minha incapacidade humana de conseguir processar uma informação para a qual não está talhada e isso prende-me…. Não vou continuar…. Vou desmaiar-----vou me calar.

segunda-feira, novembro 17, 2008

Estrela Furiosa

Vem lá do longe o eco sofrido do desterrado sol que em tempos planava pelas planícies pardacentas dos campos ensanguentados das guerras que os deuses travaram nos tempos em que o tempo não era tempo e no tempos em que os homens não eram estrelas. Ele é brando, meigo, doce, ágil e delicado. Consigo senti-lo a penetrar-me a derme, a rasgar-me as veias e a percorrer-me o sistema circulatório em minúsculas fracções de segundo e é frio, doloroso, magoado, violento e talvez vingativo, suponho que seja vingativo, não sei se é vingativo ou não, mas temo-o pela sua facção vingativa ou pelo alvo da sua vingança, que posso ser eu, embora os motivos que justificarão este ódio de mim sejam uma ainda incógnita ininteligível. Que eco maldito e deforme é este que ouço com tanta clareza e que vive do dom de me pôr a estremecer pelo desconhecido? Que razões existem para que eu tema os resquícios de um som antigo a morrer lastimoso no vazio do espaço?
O som canaliza-se para mim, flúi paulatinamente entre a complexa estrutura atmosférica e esbarra no interior dos meus ouvidos, e no desenredar do ruído ouço o grito das estrelas a morrer. O som reentrou no meu corpo, mas desta vez está próximo demais do cérebro e consigo descodificá-lo, eu sei qual é o som dúbio que se apossou do meu frágil corpo, conheço as razões veladas a cada nota emitida, eu vivo no som e o som vive em mim, somos a simbiose imperfeita das leis do universo diminuídas a relação sonora entre um emissor e um receptor e dessa relação edifica-se um estranho rendilhado de tempo e espaço bem no centro do meu peito, e a reinar nesse tecido bordado pelas aranhas mágicas do universo antigo encontra-se uma estrela moribunda que está pronta a morrer. A sua fúria é ingovernável e o meu corpo é efémero demais para aguentar as forças que o seu descontentamento provocam, mas eu consigo tocar com a ponta dos dedos nos sentimentos mais profundos dessa estrela, que são largados latentemente sem que ela tenha consciência de que os liberta e eu toco-os, acaricio-os, beijo-os com os lábio e beijo-os com as palmas das mãos, e dentro desses sentimentos renegados emerge uma doce sensação de alívio, de paz, de serenidade da qual não me sinto nobre em receber. Porque é que esta estrela, mais submergida em fúria do que a areia coberta pela enchente do mar, liberta serenidade e comiseração no momento da sua morte? Porquê?
São expelidos rugidos que crescem e diminuem e voltam a crescer e a diminuir, e é impossível aguentar a violência desta oscilação estando tão perto do seu âmago, sendo o imo cósmico deste belo e pavoroso feito.Há raios de luz a serem emitidos em todas as direcções e eu próprio desempenho o lugar da estrela na hora da morte, que me escolheu de entre muitos para ser o escudo incerto da sua fúria e guardador da sua serenidade. Os raios trespassam-me e saem à velocidade da luz do meu peito e viajam rapidamente para outros lugares recônditos do universo, são libertadas as camadas exteriores da bomba estrelar, logo após ter-se inflacionado dentro de mim, comigo, inflacionamos os dois para que o caos não se tornasse na realidade da humanidade que é minha vizinha, felizmente para mim, que tenho nas mãos o poder para ver-me livre dela para a eternidade, porém não quero nem os acho com importância para sequer pensar na sua insignificante existência neste momento de loucura. Esqueço-os. As camadas, as camadas externas da estrela quebraram as algemas e partiram em debanda em direcção ao próximo canto que albergará a próxima nova estrela e o próximo novo conjunto de planetas ou a próxima nova nebulosa planetária. A minha estrela em fúria é agora uma super nova e eu sou uma super nova consigo e ambos brilharemos juntamente, mais e mais intensamente do que qualquer outra estrela, e no nosso centro há um acumular enigmático de matéria que se adensa tão rapidamente, tão ligeiramente que destruiu o cofre de sentimentos negros que eu mantinha lacrado no centro do peito, sentimentos que levei eras a amaldiçoar e que me amaldiçoaram posteriormente, a partir do momento em que saíram do coração para ocupar o vazio que existe na minha mente, e agora fundem-se com a matéria densa que ficou exposta no momento em que as camadas exteriores da estrela se projectaram para o infinito. A fusão ocorre, e a uma intensidade desconcertante, fundem-se, fundem-se, e a estrela voltou a fundir, mas desta vez não funde hidrogénio em hélio, nem hélio em carbono, nem carbono em oxigénio…. Está a fundir a matéria extremamente densa da estrela, o seu centro, com sentimentos excessivamente densos do cofre do meu coração e a densidade está a atingir o ponto critico, não há volta a dar… os raios de luz estão a encurvar-se e a voltar à esfera de matéria densa e sentimento negro, passam pelo seu interior, são sujeitos a uma incrível transformação e voltam a ser emitidos e são-no repletos em electromagnetismo, raios púrpura são emitidos dos raios que foram capturados… Mas que raios são estes, que foram sujeitos ao peso do centro denso da estrela e dos sentimentos negros que guardava piamente no cofre do meu coração? Que género de efeitos provocarão no tempo espaço e que consequências terão para o despoletar de novos acontecimentos cósmicos que até então pura e simplesmente não existiam… O casamento entre um buraco negro cósmico e um buraco negro humano. Olhem-nas, que em tempos foram as explosões de raios gama, já não são iguais, há nelas um peso, uma dor, uma angústia, um ódio pelo nascimento e pelo renascimento que ocorre a cada minuto no universo. Será… Serão estes os raios que, depois de cozinhados a altas temperaturas no centro duma estrela moribunda que preferiu morrer num interior dum homem moribundo, tomarão o lugar de cocheiros do coche maldito que trará o tão aguardado fim ao universo através da destruição da matéria conhecida e desconhecida, da total desregulação das forças que o sustentam, da consumição da luz…. Da eterna escuridão. -------------------------

segunda-feira, novembro 03, 2008

A palavra que esconde a minha história

Empilham-se sentimentos na ponta dos dedos e uma estranha vontade de soltar as palavras que se encontram retidas na minha mente num tão longo período de tempo e o medo de cincar sopra-me com um carinho misterioso no pescoço, como se o simples acto de desejar a liberdade para o meu coração fosse o anátema para a minha existência no universo. Pianos de piedade são eximiamente dedilhados por alguém que escuto e cheiro, por alguém que consegue transfigurar-se em mim e ganhar uma imagem física limitada ao meu pensamento e de um peso imenso em tolerar o gelo começo a fraquejar, a recear cair no primeiro voo e as palavras já não estão benditas pelo livre conduto que representaria o caminho para a libertação e para o perpetuar no infinito das ideias. Esse infinito que quero e não consigo alcançar, ser uma ideia solta num pensamento, ressurgir na beleza duma palavra e renascer no universo dos conceitos, quero deixar para a humanidade aquilo que vivi, cada sentimento que experimentei, cada momento de mudez, cada dor ao acordar, cada chaga que o sol me provocou envoltas na inalcançável excelência duma palavra. Pena que não a encontre, talvez por não existir ou por não ter acesso ao dicionário que contemple todas as palavras que significam um sentimento ou uma panóplia deles, e que preencheriam os requisitos que procuro numa palavra para que esta se eternize como o diário da minha vida. Será que essa palavra não existe, neste momento, ou em outro momento qualquer no passado, quiçá no futuro, ou estarei a evita-la como sempre evitei as coisas que me faziam feliz em vez de as querer fervorosa e veementemente, para me proporcionarem uma continuidade de bem-estar, de paz e doutras realidade que afastei de mim por casmurrice. Pois, eu sei que recusei a luz, tive por ela uma relação de desconfiança, um medo incontido de gostar e querer mudar-me para a sua companhia, feliz, luminosa, alegre, meiga, branda, meu Deus, diferente do inferno que erigi para mim. E conheço a palavra, eu conheço a palavra que serve para contemplar num conceito só a história infeliz dos meus segundos de vida que, de tão amargos, se tornaram perpetuidade, conheço-a e emprego-a para situações que se afastam daquilo que realmente interessa, que nada mais é do que eu, sim, não me interesso por mim e sou um fraco por ser deste modo, um fraco que se esconde em barreiras bem sólidas constituídas essencialmente pelo medo. Agora concebo que o medo é um estético instrumento de estruturação que permite criar muralhas, torres e buracos, tudo com o objectivo de esconder-me e afastar-me da bela-luz, da alegria, do sorriso, da paz, de viver sem pensar que o meu mundo vai desaparecer, que vai ser lentamente destruído pelo invulgar poder da morte. Já sinto os entes queridos a desaparecerem, e as pessoas que existem no mesmo universo do que eu a apagarem-se, e tudo já começa a mudar e sofro, sofro, choro, chamo pelos tempos em que tudo era igual e queria que assim continuasse, desaparecem os amigos, as coisas materiais que adoro, as manifestações artísticas chegam a um limite de mau gosto que nem um cego consegue tolera-las e estou quase pronto para perecer e esperar pela decomposição para apagar com os vestígios deste anormal que viveu num mundo onde viviam homens, que, não obstante, eram iguais a si, e via ele nos homens o ódio, a raiva, a destruição, o egoísmo e a cobiça e sofria por ser homem, sofria e afastava-se cada vez mais do seu mundo. Os chamamentos do seu grupo ecoavam já distantes e o horizonte estreitava, como se o espaço físico do mundo se comprimisse, e comprimisse, até que o mundo passaria de lugar amplo a buraco exíguo. Agora, sim, agora consigo ser feliz na infelicidade, na dor e na solidão. Não há homens que não sejam eu próprio, não há vozes mentirosas e risos hipócritas, não há máquinas de destruição nem armas do holocausto, o dinheiro é um nada e o que ele pode comprar é tudo mais que nada e não há crises de qualquer espécie, só existo eu aqui, só importo eu a mim mesmo, só eu tenho-me a mim… O mundo lá fora não é relevante e não trará qualquer espécie de mudança à utopia que criei para mim, para o mundo dos sonhos que escrevi para mim, para este cárcere onde o eu consciente e o eu inconsciente trocamos ideias e roçamos o limiar da loucura quando o silêncio começa a afectar o nosso discernimento intelectual…. Céus…

segunda-feira, outubro 20, 2008

Nem sei bem quê



































Correntes de ar dum passado misterioso e nostálgico entrepõe-se entre mim e o nível contíguo a este e vergo-me sobre a pressão de memórias para as quais não encontro solução nem resolução, e lapidam-me a sanidade, lapidam e lapidam, destroem a complexa estrutura que tantos anos levei a criar para poder andar de um lado para o outro sem que o mundo reparasse na existência de um alguém que se identifica comigo e que é anulado por mim mesmo. Vivo imerso no lago gélido do reflexo dum espelho opaco que separa o meu reino dos demais reinos das pessoas, que frequentemente se entrecruzam e fundem-se em reinos únicos e gigantes com reis artificiais e doentes que anseiam pela destruição total dos seus súbditos única e simplesmente porque este ousaram desejar o alargamento irrisório e pouco credível das suas possessões e isso possui-me duma vontade indizível de morrer e matar com a morte, subir aos meandros do inferno suspenso e cair, a velocidade alucinantes, enquanto agarro anjos e os obrigo a vergarem-se ao meu capricho, ao meu desejo desolador, e tudo fica pincelado com os tons cinzentos e pardacentos da pintura da morte, dessa tão longínqua e inatingível companheira que me envia leves e doces lembranças envoltas em vento fresco da manhã. Lembro-me dela a eclodir silenciosamente do ovo barulhento do sofrimento enquanto gigantes se alimentavam alarvemente de vazio e riam e riam e riam e os barulhos infernais e silenciosos penetravam levemente no meu ouvido e o cérebro aquecia, aquecia, como a chama imortal do inferno que cresce e vive das almas sumidas que chamam por mim. E a marcha solitária dos caminhantes mudos produz uma bela melodia que ninguém quer ouvir, porque o som que eles libertam está imbuído duma verdade que todos recusam reconhecer e é essa verdade que magoa e fere e faz sangrar e quero elevar-me de sangue até que os monstros se esfumem e vazem para o mar das sombras malditas que termina no fim do meu juízo, naquele lugar lindo e florido onde Deus e o Messias aguardam por mim para me iniciarem na grande contenda. Vou, um pouco no escuro e sem saber se coloco os pés em terra firme ou se caminho em palavras soltas que não encontram conexão lógica entre elas e não edificam o caminho mágico que os grandes vultos do pensamento superior ousaram atravessar. Pena, dá-me pena ver-me a bater em todas as paredes e muros e também nos tectos e os sopros quentes do inferno em saudações para o Cristo que foi negado no dia em que o mundo iniciou o caminho da promessa antiga e tenho pena das pedras que calco, pena da água que evapora e devanea no céu sem manifestar pesar pela sua condição aborrecida de perpetua procura para a queda, e caiu juntamente com ela e com as veias jugulares que a gládio divina rasgou em punição, como uma crise insondável que começa no términos daquele maldito passado que ascende em mim e carrega os anjos no seu dorso e a veste branca mancha-se de sangue quando pousada em mim. Pobres anjos que cantam músicas infernais para alegrar a nossa passagem para o mar das águas turvas, enquanto os demónios dedilham a harpa e tocam flauta e as melodias são tão lindas e a roçar o divino que o próprio Deus abandona a carruagem de luz para agradecer aos demónios pelo presente bendito que souberam, com toda a arte e sentimento, conceber. Será que ainda tenho tempo para escolher uma carruagem de bênção pintada? Não vou a tempo e o tempo não vai comigo. Somos incompatíveis e jamais teremos desfechos viáveis para a resolução das nossas amargas desavenças e permaneceremos eternamente ligados num circuito de carruagem com destino aos lugares do divino e nesse caminho conjunto trocaremos olhares de pesar, no dia em que a morte cantar para mim.
Canta para mim minha musa, grita o meu nome e vamos fugir os dois. Naquele sono perpétuo seremos um só, para o incessante, e dele crescerão folhas impressas com listas de cores e a cromática ferirá os olhos cujas íris não tiverem cor e a cor repudiará as íris que quiserem ter cor. É esse o destino dos nossos olhares entrecruzados, tempo, que na morte deixaram de o ser e eu vencer-te-ei porque jamais farás parte dos meus dilemas. E assim me fico e assim quero fica, sem pernas nem braços, sem asas e penas que produzam melodias obscuras e lagos gélidos. Não, não. Só há negação no meu espírito é tudo tão confuso, tudo tão inversamente inverso, atrozmente atroz. ……

quinta-feira, setembro 25, 2008

Diálogos com Deus

Quero mais, quero mais, quero o futuro, quero o som de engenhos a subjugar as mecanizações físicas do seres humanos, quero uma ditadura das equações, quero anjos metaliformes a combater por figuras disformes e vãs que bailam ao som dos ecos primordiais, quero uma totalidade escura onde uma luz acende dum nada que de nada é pequeno e invisível, mas cuja força ultrapasse a astenia do meu próprio corpo físico. É de tudo isto o que eu preciso e nada mais, de concórdia e alforria totais, de rectas sem intersecção e curvas gravitacionais que espremam a minha rigidez humana, este condenado sarcófago que teima em amornar o meu ímpeto de núpcias com a energia mãe que há em mim, um sensação de pertença a algo maior do que a compreensão que não consigo compreender.
Uma obscuridade traçada em números num papel que se auto induz a conceitos enormemente precários, que nada mais são do que os convívios dos homens com a lei dos Deuses, palavras que foram aliviadas por gritos inaudíveis que se propagaram num vácuo que não concede propagação, mas as forças motrizes são tão veementes e incógnitas que as vozes dos Deuses recusam a permissão dos seus domínios para circular livremente e há sempre um homem de ouvidos apontados à comoção para descodificar essa linguagem intemporal e douta, duma erudição tão distante que os descodificadores jubilam ao ver uma estrela a vociferar em sinal de um ponto paragrafo, … ali termina uma interjeição de Deus, uma lei, um desabafo universal que às estrelas foi berrado e que às estrelas fez abdicar do seu ligar num lugar qualquer desenhado pelas mãos extensas das forças que procuro agarrar, amar e fundir-me em parte delas. Ai como é bela a pressão de milhões de toneladas em apenas um ponto no microscópico, é uma destruição que sentimos da ponta dos cabelos às células cimentadas da derme, no interior dos órgãos que formam o interno de todos nós e o limite é a eternidade em raios velozes e imparáveis, como Deus disse que seria quando a musica primeva encheu os salões do Seu reino.
Se pelo menos falasses directamente comigo e tivesses a sujeição de me explicar as nuances sombrias da tua linguagem, para que o nosso diálogo não se cingisse aos pensamentos que temo em divulgar. Queres que me tomem por louco por querer aceder-te. Eles não conhecem o poder de que és dono e todas as minhas tentativas para ter-te mais próximo de mim serão tomadas como desvios e psicoses, guiar-me-ão a um mundo onde parede almofadadas instituem um horizonte de eventos mais vazio do que a aproximação à dança catatónica dum buraco negro, é isso Deus, os buracos negros da Terra, aqueles cuja física não aceita nos seus paradigmas, é nesses que me vou acabar, à espera que me envies o sinal para o enlace final, mas garanto-me, Meu Pai Criador, não haverá nem houve e muito menos há coisa ou sensação que me possa preencher mais do que terminar-me em ti e reviver a minha vida passada num futuro maior, intemporal, onde as noções de dimensões espaciais e temporais deixam de fazer sentido e só as curvaturas dimensionais continuam, numa espécie de via ferroviária oculta pela escuridão húmida e ausente dum túnel longo. É no túnel que se inflama a nossa realidade, nas linhas incorpóreas que percorrem quilómetros e quilómetros de espaço até que o ser humano ignore termos e conceitos que facultem a compreensão da dimensão dos nossos reinos, e isso faz de nós algo maior do que um dogma, algo maior do que uma dúvida, algo maior do que uma singularidade… isso faz de nós os termos e as conjunturas que eles terão que desembrulhar num caminho continuado de decadência, dor, avanços e retrocessos, até ao momento em que o retrocesso impossibilitar o regresso e as suas construções, aquelas que com vaidade e insonolência não param de gabar, desapareçam do espaço a que chamavam universo e regressem a Ti, que nada mais és do que o seu engenheiro, desenhador e produtor.
Mas, Deus, como é que eu posso almejar tal sonho de entidade se nem da força gravitacional da terra, desta pequena e simpática terra, consigo libertar-me. Envia-me um furacão de energia, um feixe interminável e invisível de luz que esfarele a minha composição morbidamente tétrica, e assim poderei viver em partículas talhadas directamente por ti, quando nos tempos vagos te divertias a acender o rastilho de estrelas moribundas. Reclama-me novamente para ti, que seu teu em todos os sentidos. A humanidade que me concedeste através das reacções químicas estranhas que se desenrolam no meu corpo trouxe um defeito irreparável, que só me legou a sensação de exiguidade e o desencaixe a um mundo que não foi criado para a minha presença eterna. Eu vou vencer o tempo e os humanos não podem vencer o tempo, porque deixaste uma armadilha quase subtil no limiar das suas vidas, que os faz querer voltar a ser aquilo que foram, em sucessões sucessivas de repetições maçadoras e dilacerantes, e, quando assim não é, ficam outros eternamente ligados a eles chorando pelo seu regresso e pelo reinício do tempo em que tudo para eles iniciou. Eu não quero isso, jamais. Anatematizarei quem quiser aprisionar-me a esta terra com as cordas do sentimento, que impedem a progressão infinita até aos domínios do Criador. Por favor, jamais fareis isso por mim. A morte e o inferno resumiram-se ao período em que vivi com os homens, nos seus domínios, pequenos e atrofiadores, cheios de sentimentos pequenos de avareza, ganância, falso altruísmo e inveja. Esses elementos foram banidos do verdadeiro reino da verdade onde a verdade e a mentira se fundem para criar um estado de ser diferente, ausente, presente, quieto e irrequieto, onde tudo pode ser o que nada é e nada pode ser tudo o que é.
Vamos, não te quero maçar com pedidos, o tempo há-de vir e a felicidade, que desconheço mas que amo, por ver nela o inatacável do ser humano, preencher-me-á para a grande eternidade.

quinta-feira, setembro 18, 2008

Explosão

Está calor em excesso, está calor em demasia, e não corre ponta de ar para aplacar o meu sofrimento, e a temperatura continua a aumentar em proporções indizíveis, tornando-me cada vez mais dependente deste ambiente ensopado, cálido, débil e repulsivo, mas apetece-me ficar assim estagnado, parado, a dar alimento ao ser sujo que é no meu interior, naquele local escuro e torcido a que só eu consigo aceder, quero enche-lo de nada porque é de nada que ele gosta de viver, e a humidade na derme está a incomodar-me cada vez mais, cada vez mais. O mundo parou para mim, suspendeu a sua viagem no ápice exacto em que despertei para a consciência, como se num momento insignificante do tempo um sinal vermelho despoletasse duma curvatura esquiva daquilo a que uns chamam fado e outros chamam destino e ordenasse “pára, mundo, que alguém de longe veio para que o teu caminho ficasse imobilizado naquilo que um dia irás ser, que é exactamente aquilo que foste e nada mais”.
As mudanças subitamente deixaram de ocorrer e os movimentos descoordenadamente harmoniosos dos humanos nos seus formigueiros tornaram-se maneáveis, pardacentos, acabando por cessar e silenciar, e só eu me movimento, só eu consigo agitar as pernas com vontade de correr e a imagem do horizonte não afunila, permanece parada, as minhas pernas esforçam-se por dar ao meu corpo movimento, mas é tudo uma repetição aborrecida do ontem, do anteontem, do século passado, do eternamente para trás, até ao instante em que um Deus satírico e algoz deu à Luz uma bolha que cresceu e que deu à luz a Luz e que deu à luz o sol e que deu à luz a terra, que deu à luz a estagnação dos filhos que não deu à luz por saber de antemão que a inépcia de voltar a dar à luz atormentá-los-ia até ao fim da sua existência. Pois é, a eles foi jarretada a arte de dar à luz e isso fere-os e eles procuram quebrar o feitiço, contornar o destino, mas é do fado a arte de contornar e não daqueles que não podem dar à luz, dos não eleitos que fustigam o próprio corpo em nome da infertilidade.
Que mundo, Deus satírico e contemplador, que mundo feio que tiveste em pensamento quando optaste por deixar eclodir a bolha que seria o destino desse mesmo mundo, que maldade, que castigo, tu nunca tiveste o céu para dar porque limitaste-te a criar um inferno para onde reconduzes vermes que terão te aborrecido algures num momento e num espaço que só a ti fará sentido e só em ti será reconhecido, e os homens nem sequer aceitam que limitaste a sua existência à pequenez desse inferno que a determinados momentos deixa rever situações que foram nele em algum momento da sua existência prolongada aos olhos dos pequenos e tão curta aos teus olhos. Começo a perceber-te como perceberam os homens que viram em ti o único e verdadeiro deus, sem nunca alcançar a tua verdadeira forma, eu sei, mas mesmo assim consigo sentir no coração deles o medo e o receio que sentiam por sequer dizer o teu nome em vão, se o castigo era a loucura a que os sujeitaste e que agora sujeitas a mim. Leva-me para junto de ti, onde as estrelas não são estrelas e as galáxias não são galáxia, onde a luz não é luz e o que é não é. Peço-te, permite-me acompanhar-te naquele primeiro instante em que revelaste a tua verdadeira face, antes de te ocultares para sempre nas enigmáticas fórmulas que não conseguem chegar até ti. Eu estou contigo aqui, nesse momento e vejo-te tão bem como vejo o ecrã da máquina dos homens que me apoia na queda para o abismo, e clamo pelo teu nome para que possamos explodir os dois, sabendo que o amanhã era o ontem em que tu mesmo foste gerado. Vamos, que o meu corpo é susceptível à maldade e às armadilhas que deixaste no inferno em forma de bolha…. É agora………………………….

terça-feira, setembro 09, 2008

Labirinto

Propaga-se a luminosidade a centímetros da minha densidade corporal e eu estou fraco demais para poder felicita-la com uma carícia. Que frustração, que raiva incontida que procuro conter, não disporia de momento melhor para voltar a viver, ou pelo menos a acreditar, num mundo de luz e este peso enfático que facilmente me abomina impossibilitou o passo em diante que fustiga a minha lucidez. Não consigo assimilar o cerne da vida que se desenrola aqui na terra, e, contudo, procuro enquadrar-me ao quotidiano de todos aqueles que se me afiguram como exemplo, sigo as suas regras, respeito os seus rituais essenciais e edificativos, mas há qualquer coisa bem cá dentro da psique que funciona como uma corda eterna que me prende ao buraco. Se a normalidade domina a minha existência, é porque a normalidade é maçadora, aborrecida, definida e cumprida por seres humanos que desconhecem o que é viver na plenitude das potencialidades da vida. Se fujo ao comboio e opto por linhas paralelas e algo difusas, algumas criadas por espíritos desenquadrados como eu e outras que foram trabalhadas e arduamente ajustadas ao solo por mim próprio, crava-se um sentimento gritante de silêncio e paz em meu redor, um silêncio e uma paz que me fazem ressurgir duma viagem ao tétrico e ao abominável da consciência humana, mas, ao mesmo tempo, a solidão e a falta de palavras concretas, palavras ditas pelos lábios ternos de uma amigo e que flutuam no ar até se engastarem aos meus ouvidos, abrem chagas incuráveis no meu âmago e o sangue aumenta de tal maneira nas minhas entranhas que tenho obrigatoriamente que o expelir pelos orifícios abençoados que, felizmente, Deus deu aos infelizes e que são duma vulgaridade imensa e costumam ser chamados de olhos, é verdade, os meus olhos choram sangue numa intensidade incompreensível mas também invisível, porque é à alma que foi concedido o privilégio de lavar-se em lágrimas de sangue, só ela é digna duma catarse. E ninguém vê o sofrimento, porque ele não conhece alternativas de expressão, limita-se a fazer-se manifestar pelos meandros do desconhecido mundo que rodeia os nossos corpos, umas vezes em jeito de punição, noutras em jeito de comiseração, e as pessoas, quer sejam próximas e queridas, quer sejam anónimas e distantes, não sabem os segredos para quebrar o encantamento do labirinto de estados de alma que rodeiam os sofredores do vazio, que me envolvem a minha. Não há chave, não há código encantado, não a catapulta nem aríete que quebre e destrua as paredes do labirinto, simplesmente continuo sentado numa cadeira fria e cinzenta que jaz no centro equilibrado dum círculo e olho as pessoas, vejo que as suas bocas se movimentam, sinto que sentem sentimentos, que vivem com alegria e eu estou retido numa emaranhado de irrealidade que se vão acumulando em meu redor.
Queria sinceramente que houvesse alguém com o condão de me tirar daqui, com a calma com que se ensina um faminto a pescar, recuso uma saída brusca, violenta e não me sinto em condições, nem à altura, de esbarrar com um mundo que me é estranho e confuso, mas que é aquilo que quero, a amnésia para a minha loucura e o caminho silencioso que abre, lá no fim, para uma imensidão de luz.
Mas continuo a imaginar situações bonitas que mudariam o meu estado de alma caso eu tivesse a força motivadora, a vontade firme e o desejo real de sair daqui, e, de facto, é tudo apenas uma das inúmeras mentiras que tento vender a mim próprio. Ninguém percebe, ninguém vê, eu continuo a ser e a existir no mesmo mundo em que existem as pessoas, mas a minha imagem, aquela que é reflectida pelos meus olhos, é totalmente desfocada em pensamento cuja origem desconheço mas que acredito provirem de algum mal de ordem mental, um mal que teimo em não querer assumir e que alimento no fluir da minha continuidade temporal, vivo e consciente.
E depois surgem as interrogações…. Se eu fosse de outra maneira, continuaria a encontrar forças para resistir, continuaria a apreciar as coisas grandiosamente insignificantes do ser humano, da terra, do sistema solar, da via láctea e do universo em geral? Teria disposição ou auto motivação para contemplar situações que em grande parte carecem duma profunda solidão para serem vivenciadas em todo o seu esplendor?
Peso nos olhos, peso nos olhos, pouca fluência de ideias, lobos cerebrais em quase dormência… erros

terça-feira, setembro 02, 2008

As duas existem e estão aqui, silenciosamente contemplativas






























Diz-me duma vez o porque de não ergueres esse corpo leve do canto escuro dessa sala onde te encobres, quando lá fora o tempo move-se lestamente e não se absorve se o acompanhas ou não, nem mesmo se importa com o fundo dourado da tua cela, que nada mais é do que um estratagema teu para enriqueceres algo que é pobre por natureza e irremediavelmente finito. Consegues escutá-los, aos sons quânticos, que atravessaram incontáveis dimensões para alcançarem este tugúrio vazio e magoado, roçando aos nossos ouvidos como pequenos queixumes que não sentimos compreender, talvez por falta de habilidade ou por falta de interesse, mas que, na realidade, estão aqui para contemplar-te e para te fazerem acreditar na tua própria veracidade enquanto criatura respirante e biologicamente presente.
Já não há luz no fundo da vida, sabias? A tua recusa permanente em combater as entidades escuras que te bajulavam afastou a luz, levou-a à exaustão definitiva, e quando lá chegares nem mesmos os olhos, que gabas serem os melhores de entre os animais noctívagos, valer-te-ão quando a boca da morte estiver aberta para ti, nos silenciosos últimos momentos em que o suor brota dos poros da derme a um ritmo metabolicamente executado. A miséria ve-me a dançar com as nuvens e inveja-me por ser eu um dos detentores do fluido divino que escorreu naqueles dias antigos em que os homens apedrejavam aqueles que pelos quais sempre haviam clamado em nome duma salvação egocêntrica e invejosa. Numa única noite banhei-me nele e dele ganhei a luz que cruza o universo à velocidade dela mesma, e não a velocidade de quem a quis prender em teoremas e fórmulas pequenas do intelecto humano. Eu dancei com a luz e os nossos pés chapinavam naquele sangue que vivia de aura distante e poderosa. A nossa dança prolongou-se até que os planetas dispersos se unissem sob a égide de um rei absoluto, intolerante e punitivo. Esse rei que, de guloso, quer morrer e da morte quer o fim dos seus mais próximos, num acto de petulância sem igual, pelo menos para ti, que és homem e não tens o dom de ditar sobre os ditados de ninguém. O que eras agora é apenas um antes que é para ti. Vale a pena um sacrifício tão ímpio e imoral levado a cabo por um impuro e pérfido ser humano. O mundo está quase completo na sua aparência disforme e só tu pensas conseguir vislumbrar por de entre as brumas que os acasos deixaram calmamente para ti, para tua confusão e para o nosso desespero, e o nosso novo amor ressente-se das estocadas frias que imprimiste aquando da tua irracionalidade psicótica, quando as trompas dos guerreiros medi orientais soaram do alto da duna que planeavas conquistar para ti, para teu próprio recreio, como se a duna quisesse responder e submeter-se aos teus singelos caprichos de criança sem futuro, sem arte, sem alma, sem vontade de viver, de vida de pernas para o ar, num caminhar em constante desavesso. Bonito, que bonito é ver o monte deserto a ser bordado com chamas e raios de sol, dum sol que ganha cor a cada disparo incógnito vindo do limiar do horizonte, local onde em tempos querias erguer um castelo, que nada mais era do que a tua câmara de torturas, porque eu sei, sei aquilo que tu sabes e finges esquecer… Eu sei que o teu sonho era destruir o sol, seres o seu algoz como ele sempre o foi para ti, cantando aqui e ali aquele som quase mudo ao qual te tornaste intolerante.
O veneno sobe lentamente às reacções eléctricas cerebrais e sentes-te afectado pelos seus efeitos, que não raras vezes dizes ser a melhor coisa que experimentaste nesta terra, que para ti não é novidade, que é e será sempre o teu reino, já que existes desde tempos imemoriais e continuarás a existir até tempos imemoriais, quando o sol e a terra forem meras memórias dum homem imemorial.

Perdoa-me se te maço, mas estar dentro da tua cabeça exige-me imensa interpelação, questões afloram das incongruências inconsistentes e doentes que montaram acampamento dentro de ti. Continuo a divagar nessa mente em dia de furacão.

segunda-feira, setembro 01, 2008

O mundo curva-se aos meus pés em jeito de clemência e eu sei que gosto quando o manto de escuridão nocturna me traja de rei. Sou o césar dos fracos, que de mais fraco conseguiu o topo da hierarquia, um pouco sem querer, mas estima-me este lugar de destaque em relação a ninguém, uma vez que todos os outros estão acima de mim numa estranha escala que prevê um lado de positividade e outro que prevê a negatividade., e isso faz-me sonhar com a singularidade absoluta que só às sombras do universo é permitida. A beleza das palavras de alguém que fogem de mim a velocidades dos taquiões, hipoteticamente superiores à velocidade da luz, que criam requiem sustenidos a anjos que, de tão revoltados, tomaram a corajosa decisão de se verem livres das asas e vivem enjaulados em rochas a ferver que há momentos foram expelidas do profundamente quente centro da terra. É ver dias a receber a noite e noites a receber o dia, numa troca simpática de favores, que chega a ser dolorosa pela falta de criatividade e de renovação, só porque se sentem no direito de gozar de brincar com a luminosidade de aqueles que infortunadamente caíram neste mundo luminoso de para quedas. Não tenho paciência para esta troquinha benévola do ora agora brilho eu ora agora brilhas tu. Eu quero-os a ambos a abrasar no mesmo segundo, quero que uma energia descomunal penetre nas dermes dos ratos que caminham em duas pernas, quero sentir o cheiro a carne em combustão, enquanto regozijo sentado a boleia duma meteoro que passa. E as baleias a cantaram para mim, no dialecto que só nós somos capazes de entender, dor, sofrimento, falta de ar e náusea, como se a passagem pela vida se resumisse a vê-los arder como ardiam as bruxas e os judeus sob a égide dos tribunais medievais e pelo obsoleto santo oficio. Pergunto-me se consegues ver-me a viajar com os fotões e tens aquela estranha sensação de que fiquei imortalizado na tua retina e que o tempo parou para mim, mas eu trespasso-te efectivamente, sem que tu tenhas tempo sequer para respirar e já sou parte do quando percebes que é futuro. As mãos cobrem o rosto e agitam os cabelos que tombam sobre a minha testa, infecta e perniciosa, o sarcófago da minha doença o cerne da minha dor, tudo, onde tudo e nada estão errados, onde quero ser e desaparecer e voar ao sentido do vento cósmico carregado de radiação que alterará a minha composição até que restem meramente a cinzas quânticas do meu tempo aqui, no inferno dos corpos que não querem morrer.
Os tipos que assassinam as baleias estão ligados de corpo e alma ao demónio e são tão ingénuos e pequeninos que não foram capazes de perceber isso, o que está ao alcance de qualquer ser unicelular ou dum composto carbónico que ainda não descobriu que pode, de um momento para o outro viver. Eu vivo dentro delas e escuto o grito de sofrimento que emitem, leio-o, vivo-o e transformo-o em mensagem livre que ecoará por milhares de milhões de anos no universo, até ao momento em que o apelo se converte em cominação, numa tremendo desafio bélico à humanidade. Que caramba, afinal estou aqui, entre as quatro paredes que prendem a minha inconsciência. Posso libertá-la? Alguém é cortês e responde-me se posso efectivamente deixar-me apresar pela inconsciência e viver livremente como todos os outros quereriam viver.
Não há resposta, porque não há aqui vivalma, nem aqui nem em lado nenhum, aqui só existo eu a falar comigo próprio. Que perda de tempo.